Notícias

Adolescente revela drama do trabalho infantil em poema

Publicada em 21/06/2023, às 13h15 | Atualizada em 21/06/2023, às 13h18

Por Rosa Blackman (rosa.adrianaeira$4h064+pref.vitoria.es.gov.br), com edição de Andreza Lopes


  • Erradicação da pobreza
  • Saúde e bem-estar
  • Redução das desigualdades
  • Paz, justiça e instituições eficazes

Foto Divulgação
Adolescente declama poesia na abertura do IV Seminário Programa de Erradicação do Trabalho Infantil
Adolescente declamou poesia na abertura do IV Seminário Programa de Erradicação do Trabalho Infantil. (ampliar)

Para quem pensa que o único problema de crianças e adolescentes que trabalham numa feira, vendem balas nas calçadas ou fazem malabares nos semáforos, é o incômodo de decidir comprar os produtos ou dar gorjetas, está na hora de ouvir o que eles pensam. Foi o convite feito por Alice (nome fictício para não identificar a adolescente), de 15 anos, que há um ano vive no Serviço de Acolhimento Institucional da Secretaria de Assistência Social de (Semas) Vitória.

Ela contou que utiliza a linguagem poética para externar todo seu sofrimento, falar das violências sofridas, enquanto obedecia às ordens do pai da obrigação de cuidar dos irmãos menores, dos afazeres domésticos e de trazer dinheiro para casa vendendo balas nas ruas.

Alice declamou uma de sua poesias na abertura do IV Seminário Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (Peti) Metropolitana, para uma plateia formada por trabalhadores do Sistema Único da Assistência Social (Suas) e estudantes da área. Ao descer do palco, ela fez questão de falar mais sobre sua vivência.

Diante desta trajetória, com olhar triste e visível timidez, Alice falou que "tirou forças lá do fundo" para declamar sua poesia, intitulada "Você não sabe".

"Esta fiz, justamente, para o dia de hoje. Eu estava angustiada, pensando que eu tinha que ser a voz das crianças e adolescentes que sofrem. Quero ser uma voz combativa de todas as formas de violências que roubam à infância e a adolescência de tantos de nós. Se tiver um agressor aqui ele sentiu. Queria que meu pai estivesse aqui", comentou ela.

Foto Divulgação
Adolescente declama poesia na abertura do IV Seminário Programa de Erradicação do Trabalho Infantil
Adolescente declamou poesia na abertura do IV Seminário Programa de Erradicação do Trabalho Infantil. (ampliar)

"Eu já passei por tudo. A rua é muito perigosa. Ou é cadeia ou é caixão, ainda mais para meninas", afirmou ela. Na oportunidade, foi pedido a Alice falasse mais sobre sua vida. "O que me salvou foi o acolhimento da prefeitura, caso contrário teria ido para a prostituição, virado mulher de bandido ou traficância", disse Alice.

Ao perceber que a segurança com a qual contava sua história surpreendia, a adolescente, de 15 anos recém completados, quis contar mais sobre sua infância. "Meu pai me batia todos os dias. Quando tinha três anos minha mãe morreu e, eu tinha que cuidar dos meus irmãos. Aos seis anos, passei a ser obrigada, também, a fazer a comida. A tortura psicológica era grande. Ele falava muitas coisas pesadas. Era tortura psicológica mesmo. Eu corria da situação. Eu queria que alguém denunciasse. Quando denunciaram e fui para o abrigo descobri uma família, uma rede de apoio, pessoas para caminhar junto protegida", contou.

Alice complementou com versos do poema: "Você não sabe como é ter que trazer o sustento para casa, porque o pai não quer trabalhar. Você não sabe o que é ser humilhado e maltratado. Você não sabe como é ser exposto nas ruas. Você não sabe como é não ter amor e carinho. Você não sabe como é não ter uma família, ter que cuidar sem ter sido cuidada. Agora, luto para que ninguém perca a sua infância e adolescência", falou.

A secretária de Assistência Social, Cíntya Schulz, disse que a fala de Alice reflete o quanto é importante trabalhar para erradicar o trabalho infantil e como a política de Assistência Social é necessária em nossa sociedade. "Tenho certeza que a voz dela pode ajudar a construir uma nova realidade para crianças e adolescentes", afirmou Cintya.

Sonho

Foto Divulgação
Adolescente declama poesia na abertura do IV Seminário Programa de Erradicação do Trabalho Infantil
Abertura do IV Seminário Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (Peti) Metropolitana (ampliar)

Apesar de todas as dores vividas, Alice disse que, agora, no Serviço de Acolhimento Institucional 5, voltou a sonhar. "Quero ser juíza. Quero lutar para salvar vidas. Quero ser a voz. Quero ser um meio para defender as crianças. Quero que meus poemas inspirem e ajudem a outras pessoas", comentou.

Para o coordenador do Serviço de Acolhimento Institucional 5, que acolhe adolescentes de 12 a 18 anos, Hieverson Caser, o seminário deve ter este caráter de escuta dos próprios adolescentes. "Ela, através de seu dom da escrita e poesia, consegue externar e emocionar os participantes do seminário com sua história, além de nos trazer a reflexão do desafio na luta contra qualquer tipo de violência contra crianças e adolescentes. Também incentiva ainda mais a cultura e o protagonismo desse público. Dar voz e podar a violência", ressaltou ele.

Para a gerente de Proteção Social Especial de Média Complexidade da Semas, Fabíola Calazans, o Seminário fez ver a potência do trabalho preventivo com a apresentação do Serviço de Convivência para Criança e Adolescentes, ratificando um lugar seguro de ser criança. "Também mergulhamos na complexidade da identificação pelo Serviço de Abordagem Social e do acompanhamento do Paefi (Serviço de Proteção e Atendimento Especializado a Famílias e Indivíduos) dessas crianças e adolescentes", afirmou.

"Refletimos nas palavras poéticas de Alice, que nos presenteou com a ressignificação de sua trajetória a partir te todo trabalho realizado pela equipe do Serviço de Acolhimento Institucional 5, nos dando a oportunidade de acreditar sempre na potência do trabalho social", completou Fabíola.


Voltar ao topo da página